Lei de Improbidade Administrativa e sua prática
Hoje, dia 02 de junho de 2021, a Lei nº 8.429, também conhecida como “Lei de Improbidade Administrativa”, completa 29 anos de vigência, desde a sua publicação no ano de 1992.
Apesar de referida lei não ter conseguido cumprir o que dela se esperava, ou seja, impedir a prática de atos de improbidade administrativa, entendo que mesmo assim temos motivos para comemorar. Afinal, atos ilícitos que até então ficavam impunes a partir dela passaram a ter a previsão de alguma sanção.
Inicialmente, é importante esclarecer que o termo “probidade” está relacionado à honradez e moralidade, mas o legislador brasileiro, ao contrário de definir o que é moral, optou por determinar o que é imoral, ou seja, o que é improbidade.
A referida lei define três espécies distintas de atos de improbidade administrativa, trazendo vários exemplos para a caracterização de tais atos, os quais são meramente exemplificativos, podendo ocorrer diversos outros casos puníveis.
A primeira das espécies diz respeito aos atos que importam em enriquecimento ilícito dos agentes públicos (art. 9°), ou seja, os casos em que eles recebem qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade pública. Para a configuração deste ato de improbidade, deverá ser provado que o agente aumentou o seu patrimônio a partir de sua atuação de forma ilícita.
A título de exemplo, se um servidor público municipal adquirir uma casa, veículo ou qualquer outro bem que tenha valor desproporcional com a sua renda ou evolução patrimonial (inciso VII, do art. 9º) restará configurada a prática de ato de improbidade administrativa.
É importante deixar claro que, em tais casos, pouco importa se o patrimônio público sofreu prejuízo ou não, sendo que tal fato não precisa ser provado, bastando ficar demonstrado que o agente público enriqueceu de forma ilícita.
Dentre as condutas que causam danos ao erário, também são considerados atos de improbidade administrativa “qualquer ação ou omissão para conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário contrário ao que dispõem a Lei no caso do Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN), de competência dos municípios e do Distrito Federal (art. 10A). Nesse caso, o objetivo é impedir que autoridades municipais concedam benefícios indevidos em relação ao referido tributo.
A segunda espécie de ato de improbidade administrativa consiste naqueles que causem lesão aos cofres públicos (art. 10).
Aqui se faz necessário um esclarecimento: nesse caso, a lei não exige que o agente atue com dolo, ou seja, vontade livre e consciente para a prática do ato, reconhecendo que o prejuízo ao patrimônio público pode decorrer da atuação com culpa, em qualquer de suas espécies: imperícia, imprudência ou negligência.
Outro aspecto importante é que, ao contrário dos atos e improbidade definidos no art. 9º, da Lei de Improbidade Administrativa, para a configuração dos atos de improbidade previstos no art. 10, não se faz necessário que o agente tenha obtido qualquer tipo de vantagem ou mesmo que esteja demonstrado o seu enriquecimento ilícito. A Lei se contenta com a demonstração de prejuízo ao erário, sendo indiferente se tal prejuízo vem acompanhado ou não do enriquecimento ilícito do agente.
A título de exemplo, se no caso das atividades relacionadas ao combate à pandemia da Covid-19 restar provado que o patrimônio público sofreu algum tipo de prejuízo, poderemos ter a ocorrência de ato de improbidade, independentemente de se conseguir provar que alguém ganhou vantagens ilícitas em razão de tal ato lesivo ao erário.
A terceira espécie de atos de improbidade administrativa se refere aos atos que violam os princípios que devem nortear a atuação da Administração Pública (art. 11). Dentre tais princípios, merecem destaque os que se encontram expressamente previstos no art. 37 da Constituição Federal e podem ser memorizados por meio da palavra “LIMPE”:
1) Princípio da legalidade: a Administração Pública somente pode agir no limite da lei, fazendo o que ela expressamente determina ou autoriza.
2) Princípio da impessoalidade: é um mandamento para o administrador público agir de forma despersonalizada, buscando atender ao interesse público, vedando a atuação que tenha como objetivo atender a interesses pessoais, sejam eles do administrador ou dos administrados.
3) Princípio da moralidade: a Administração Pública deve tratar a todos com igual respeito e consideração, reconhecendo em cada pessoa um titular de direitos.
4) Princípio da publicidade: é um mandamento para que a Administração Pública atue com transparência, pois, afinal, como alerta o escritor argentino Gordillo, “a luz do sol é o melhor dos desinfetantes, a luz elétrica a melhor polícia”.
5) Princípio da eficiência: os agentes públicos devem agir de forma a extrair o melhor benefício econômico e social de seus atos, em relação aos recursos aplicados.
Nesses casos, é possível afirmar que o ato do agente público que é imoral, mesmo que não seja ilegal, caracterizará um ato de improbidade administrativa. Da mesma forma, a atuação ineficiente pode ser considerada um ato de improbidade administrativa.
Como vemos, várias são as hipóteses nas quais teremos atos de improbidade administrativa. Infelizmente, como também já mencionado, a Lei nº 8.429/1992 não conseguiu impedir que os atos de improbidade ocorressem e a pandemia da Covid-19, ao contrário, se apresentou como terreno fértil para a prática de tais modalidades de atos ilícitos.
Nesse cenário, resta-nos desejar um feliz aniversário para a Lei de Improbidade Administrativa e que ela continue a ser uma ferramenta eficaz para punir os maus gestores públicos.