Entrevista da Semana

‘Ter disciplina financeira hoje evita sufoco amanhã’, aconselha economista

Marisa espera a redução da Taxa Selic para 2026 (Foto: Arquivo pessoal)

Com a chegada de 2026, muitas famílias voltam a se perguntar como organizar melhor o orçamento diante de um cenário que ainda inspira cautela. Juros altos, dívidas acumuladas, custos fixos crescentes e a sensação de que o dinheiro acaba antes do fim do mês fazem parte da rotina de boa parte da população.

Pensando nisso, o Marília Notícia convidou a economista Marisa Rossignoli com um objetivo claro: ajudar o leitor a tomar decisões mais conscientes sobre dinheiro neste ano que se aproxima. Ao longo da conversa, ela compartilha orientações práticas para quem precisa lidar com orçamento apertado, reorganizar gastos, negociar dívidas e planejar melhor o futuro financeiro da família.

De forma simples e direta, Marisa fala sobre como evitar armadilhas do cartão de crédito, reduzir despesas do dia a dia, escolher melhores opções de investimento, avaliar financiamentos e fazer escolhas mais seguras em um ano que pode trazer oportunidades, mas também exige atenção, planejamento e disciplina financeira.

Marisa destacou que é importante pagar primeiro as dívidas principais (Foto: Arquivo Pessoal)

***

MN – Quais são os desafios econômicos previstos para o Brasil no próximo ano? Já existe algo identificável?

Marisa Rossignoli – O maior desafio é conseguir reduzir a taxa Selic, com previsão de início de queda entre janeiro ou março. O ponto crítico para o setor produtivo e para o consumidor é que essa redução ocorra sem gerar aumento da inflação. Além disso, embora o desemprego esteja em nível baixo, o desafio é converter esse cenário em empregos de maior qualidade e melhor remuneração. No geral, a expectativa é positiva, com inflação na meta e PIB crescendo entre 1,6% e 2,5%, embora o cenário político de eleição possa “dar uma tumultuada”.

MN – O cenário eleitoral costuma influenciar muito e tornar a economia mais imprevisível?

Marisa Rossignoli – O mercado produtivo e financeiro têm conseguido seguir de forma relativamente independente das polarizações políticas. No entanto, a polarização é ruim porque costuma vir acompanhada de um pessimismo que não é obrigatoriamente real, muitas vezes baseado apenas na preferência ou rejeição a um governo.

MN – Como a taxa Selic impacta a vida de quem não acompanha a macroeconomia?

Marisa Rossignoli – A Selic é a referência para toda a economia. Quanto mais alta ela estiver, mais caro fica o custo do capital: financiamentos habitacionais, de veículos e compras parceladas tornam-se mais difíceis. Por outro lado, ela favorece quem tem dinheiro investido em renda fixa. A manutenção de taxas elevadas serve para conter o endividamento e controlar a inflação quando há excesso de consumo.

Limpar o nome é sempre importante, mas é preciso cuidado para não fazer novas dívidas (Foto: Arquivo pessoal)

MN – Em relação ao dólar, como ele deve se comportar?

Marisa Rossignoli – A visão geral é de um dólar mais estabilizado, sem previsões de alterações significativas em relação ao patamar atual. Contudo, o cenário internacional, como guerras e tensões geopolíticas, pode afetar essa estabilidade. Tivemos recentemente a discussão sobre o “tarifaço”, do qual o Brasil acabou se saindo bem ao encontrar outros parceiros e rotas de escoamento da produção. Hoje, a taxa de juros preocupa mais o empresariado do que o próprio tarifaço.

MN – Qual o primeiro passo prático para as famílias que vão começar 2026 com o orçamento apertado?

Marisa Rossignoli – O primeiro passo é o planejamento real, para tomar consciência da dimensão do problema. É por meio dele que se evitam gastos impensados. As grandes contas — aluguel, faculdade, carro — normalmente são conhecidas; o perigo real está na soma de pequenos valores e no uso impensado do cartão de crédito.

MN – Então esses pequenos gastos seriam os “vilões invisíveis” do salário?

Marisa Rossignoli – Com certeza. Agregamos novos custos fixos, como celular, internet e assinaturas de streaming. O gasto sem planejamento, inclusive no supermercado, corrói o orçamento ao longo do mês.

MN – Sobre o supermercado, vale mais a pena o atacarejo ou as compras semanais aproveitando ofertas?

Marisa Rossignoli – Depende do perfil da família, mas gosto da combinação: usar o atacarejo para itens básicos e aproveitar ofertas pontuais para outros produtos. O risco de ir ao mercado apenas “pela promoção” é sair com dez itens que você não precisava. Por isso, o planejamento é fundamental.

Marisa Rossignoli é economista em Marília (Foto: Arquivo Pessoal)

MN – Existe margem para negociação nos reajustes de aluguel e escola?

Marisa Rossignoli – Existe, mas é preciso preparação. As escolas costumam seguir índices próximos à inflação, e o IGP-M, usado em muitos contratos de aluguel, fechou o ano próximo de zero, o que dá base para negociar. É importante observar que esses reajustes muitas vezes chegam antes do dissídio salarial da categoria, o que exige cautela financeira.

MN – Para quem está endividado, existe uma hierarquia de dívidas a serem pagas primeiro?

Marisa Rossignoli – Sim. As dívidas mais caras devem ter prioridade: cartão de crédito e limite de conta, o cheque especial. Se a pessoa está “rolando” a fatura, pode valer a pena contratar um crédito bancário com taxa menor para quitar esses juros altíssimos. Também recomendo evitar cartões de loja e concentrar tudo em um único cartão, para ter uma dimensão real dos gastos.

MN – Programas como o “Desenrola” ou feirões limpa-nome valem a pena?

Marisa Rossignoli – São extremamente positivos, mas existe o risco de a pessoa limpar o nome e contrair uma nova dívida logo em seguida, ficando com duas pendências no orçamento.

MN – No campo dos investimentos, a poupança ainda vale a pena?

Marisa Rossignoli – O brasileiro perde dinheiro na poupança. Existem opções de renda fixa, como CDB, LCI, LCA e o Tesouro Direto, que são muito mais interessantes. Para quem não conhece o mercado, o ideal é buscar instituições credenciadas pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que garante até R$ 250 mil por CPF. Muitos bancos permitem começar com valores a partir de R$ 200 ou R$ 300.

MN – E a previdência privada?

Marisa Rossignoli – Sou muito favorável, especialmente para o planejamento de longo prazo. A grande vantagem é a disciplina do débito mensal, que evita que a pessoa use o dinheiro para gastos imediatos, como viagens. Como as aposentadorias pelo INSS tendem a não ser altas, trata-se de uma segurança necessária.

MN – 2026 será um bom ano para financiamento de imóveis?

Marisa Rossignoli – A tendência é que seja mais positivo do que o ano anterior, diante da expectativa de queda da Selic. Por ser um ano eleitoral, costuma haver estímulos à redução de juros para facilitar o acesso ao crédito.

MN – Entre alugar ou comprar um imóvel, o que faz mais sentido?

Marisa Rossignoli – Se a pessoa tem todo o capital disponível, aplicar o dinheiro em renda fixa e pagar o aluguel com os juros pode render mais. Mas, se não tem o valor e precisa de um teto, o financiamento é preferível ao aluguel, desde que a parcela caiba no bolso, para que o pagamento resulte em patrimônio ao final.

MN – Algum alerta ou dica final que gostaria de deixar?

Marisa Rossignoli – Gostaria de alertar sobre o risco dos jogos virtuais, as chamadas bets. Eles não são renda extra, são jogos, e estão destruindo orçamentos familiares. Outro ponto de atenção é a facilidade do consignado CLT e da antecipação do saque-aniversário do FGTS. Por serem processos digitais rápidos, muitas pessoas contratam sem avaliar o impacto de longo prazo e os juros envolvidos, ou acabam ficando sem o saldo total do fundo em caso de rescisão.

Alcyr Netto

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